Estesia

Percepção sensação impressão expressão... Somos um pequeno grupo de amigos empenhados em reagir a alguns estímulos; a idéia é registrar uma reação como um flash despretensioso, registro provisório do que, provavelmente, não chegará a conhecer forma mais consistente ou duradora. Um amontoado de esboços que nunca verão arte-final.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

A Revolução Corinthiana - Contraponto

Comecei um longo texto, mas vou pontuar algumas considerações de forma sucinta sobre os episódios recentes envolvendo a vida corinthiana.

1) Mídia: O Corinthians é um dos clubes mais populares e que mais vende comercialmente qualquer coisa. A mídia sustenta o discurso da obrigatoriedade do título da libertadores e trata a disputa como se fosse uma guerra. A torcida absorve o discurso e por um lado faz da Libertadores a única coisa que importa e por outro reage nas derrotas como se se tratasse de uma verdadeira guerra.

2) Torcida Organizada: é uma parte importante do futebol no Brasil, surgida no seio da ditadura militar. Em períodos de exceção se contesta também por meio de atitudes violentas. Tal prática ainda resiste dentro das organizadas, que vivem uma crise de organização, a mesma crise que partidos de esquerda passam atualmente. Com a marginalização promovida pela mídia, com a despolitização dos anos pós-URSS e com o individualismo crescente do período neoliberal, as torcidas eclodem de tempos em tempos, abestalhadas, dando pontapés em ônibus.

3) Estrutura do futebol: a demora para encontrar um caminho ímpar de sustentabilidade cria discrepâncias no futebol. Um time como o Corinthians tem uma folha salarial de 7 milhões de reais mensais e um futebol risível. O dinheiro vira fim e não meio, e o futebol mero produto. No discurso hegemônico a torcida é o maior patrimônio do clube. Valoriza-se o passado, a história dos clubes. Principalmente do Corinthians. Na prática os torcedores são tratados como animais, frequentam estádios perigosíssimos, com banheiros imundos e uma polícia violenta. Quem é tratado como animal, reage como animal. Tudo isso pagando módicos 50 reais por partida. Sem contar os 10 reais dos flanelinhas ou 30 dos estacionamentos, 5 reais do pão com salsicha, 4 reais da água de copo e ausência de bebedouros, de fiscais que informam, em suma. Seria uma longa lista de maus tratos.

4) Ainda sobre a estrutra do futebol: o time do povo não pode ter produtos tão caros, ingressos tão caros e uma participação política tão limitada do povão. O Corinthians precisa se democratizar como fez o Internacional de Porto Alegre (outro time de origem popular). Se a prática democrática for a tônica por parte do clube, a reação dos torcedores que vivem os bastidores seguirá pelo mesmo caminho. Apesar da queda do Dualib, o Corinthians é uma República de 30 milhões, governada por 300 conselheiros, que ninguém sabe quem são, alguns vitalícios, como na anacrônica república romana. Digamos que estamos mais para uma cultura política fascista que propriamente republicana e democrática. A reação da torcida é um indício e consequência desse fato.

5) A mídia cria inverdades: não foram arremessadas pedras sobre o ônibus. Foram arremessados cascalhos. Os torcedores chutavam abestalhados o pára-choque do ônibus, o que demosntra desespero, não terrorismo. A mídia distorce, aumenta, incapaz de discutir seriamente o que acontece, estudando fatos e atitudes. Ouvi um jornalista dizendo que estes torcedores deveriam (Paulo André, zagueiro disse a mesma coisa) protestar contra as mazelas do país. Mas se estes torcedores fizessem essa opção a mesma mídia os acusaria de banditismo social (como o fazem com o MST, com o MTST, com as organizações estudantis e sindicais) e a polícia MILITAR reagiria jogando bombas e batendo nestes (como fizeram em janeiro em São Paulo com 2000 manifestantes que reivindicavam diminuição do valor da passagem de ônibus). Fico pensando também, que não são os torcedores que deveriam mudar seu foco, mas a população seguir seus exemplos e reivindicar melhorias e maior participação nas decisões do país. Quando moradores queimam pneus nas ruas são tratados como vândalos, quando o MST ocupa fazendas, são invasores, ladrões. O que a mídia quer é mudar o foco e não discutir as causas profundas que geram atitudes como essas.

6) Não há mudança sem luta: os torcedores acostumados a serem mal-tratados e espancados pela PM por onde passam sabem que não há mudança sem luta. Jogar cascalho em quem ganha no mínimo 100 mil cascalhos por mês é apenas uma forma de contestar. Dentre muitas que ocorreram na manhã de ontem. Futebol é coisa séria. O que está em disputa é se o futebol será mais um entre tantos produtos, ou se continuará sendo fator de construção de identidade cultural e de manifestação massiva de prazer e religiosidade.

7) Defendo a livre organização das pessoas em pról do que bem entenderem. A dissidência da Gaviões que praticou os atos ontem é muito politizada e sabe bem o que está em jogo. Não deve matar ninguém, nem bater em nenhum jogador. Mas deve deixar claro que não depredou patrimônio nenhum, como a mídia faz questão de dizer. Os carros quebrados no CT nada tem a ver com estas organizações. Os caciques corinthianos que deixem de ser covardes e venham na mídia dar explicações. Para ofender rivais, nosso presidente não se cansa em aparecer. Agora venha e dê justificativas, demonstre o planejamento e deixe de ser um covarde.

Aqui é Corinthians. Ninguém é mais importante que o Corinthians. Nem Ronaldo, nem Andrés Sanchez e nem o Lula. No Corinthians só a torcida é tão importante quanto o clube. A ela deve-se respeito e satisfações. A ela e em pról dela, deve-se criar uma República Popular verdadeira e não falaciosa como se diz. Os adversários que me perdoem. Piadas e provocações fazem parte do futebol. Mas no Corinthians, só quem é. Pelo Corinthians, com muito amor, até o fim.